ISCAS DE PEIXE-PIÇA, 2004
NO TEMPO DA FRUTA FRESCA *
Era uma vez um ser erótico que de tanto crescer se tornou gótico. 1,2,3, entrada pelo pórtico de quem quiser abrir sem infringir males de mel e folhas de papel, com palavras e cenas… ideias obscenas. Ohhh! Dor. De calor morri por não conseguir parar de amar a grande bola de fogo e eiro…
Fogareiro meu senhor ateai a luz da minha lenha! Sem manha meu amor que eu sou sensível até o dia em que for um ser erótico.
Pico a pico vale a vale de estouvada fiquei sem parada de homens fardados a guerrear pelo bem, pelo seu bem e dos seus.
Os seus dias passados de alegria em que se coçavam à vontade sem provocar desdém pela vizinhança.
Em criança tornei-me um ser erótico depois veio a adolescência e toda essa ciência e a morte caiu sobre o meu orvalho. Agora só pinga de cima quando chove e molha.
Não se produz, fabrica-se. Fabriquemos seres sérios e feios de acne irremediavelmente recalcado pelo clearasil da civilização.
Junto ao cão sinto mais coisas que junto a Napoleão.
Amar é bom como a bolota diz a porca para a carroça.
No caixão voltarei a ser o ser erótico a que sempre me propus para combater as almas sem corpos os corpos sem almas na guerra de si para com Si.
Viva o amor camaradas que é certa a hora da chegada!
Sigura vai à fonte a Maria do Monte e leva na cesta toda a sua fruta e ainda lhe chamam de puta. Ingrata generosidade que sempre que se dá é egoísta sempre que se guarda é fascista.
Meu amor! - disse um dia, a João que penteava a cona e comia melão
Dor a da avó que não vê os seus netos contentes por foder. Trocou-se o prazer pelo poder, e tem-se o poder de não foder, nem morrer, nem viver.
Oswaldo bom moço desleixado
Tinha defeito nas pernas pois só andava de lado
Quando a Tia apareceu alguma coisa nele cresceu
A Tia era daquelas do: Não se mete!
Trazia na mão um suiço canivete.
Viva o amor cheio de louvor nos dias de braseiro.
Quando te vi de soslaio quis-te perguntar e respondeste: amar é uma questão sem razão, coisa de encher o pulmão, são dias de não, oportunidades de ocasião.
Amor é amor e pronto diz assim o velho tonto.
Minha linda menina pegai na latrina e correi a levar água aos patos. Amável senhora de peito glorioso, pegai no tapete e correi a colocá-lo debaixo do joanete pois que seus amáveis pés, senhora, não pisam senão solo sagrado de ouro fumado e de cada vez que suas unhas crescem cravam-se no soalho marcas históricas de uma personagem nobilíssima pelo mundo dos frívolos vivos.
João da Silva Canhão na igreja, morto, frio e roxo
ainda pegava no pénis que toda a vida fora coxo.
Sinhora, sigura, sangue de vigor para me encher o chouriço.
Hoje será prazer de sangue, amanhã morcela.
De cada vez senhora, que seus filhos nascem, desce um anjo no seu regaço ansioso por mamar do néctar do seu peitaço. Senhora de flora mental, coisa ocasional, fora do normal a graça de flores e cores e amores tudo concentrado em apenas um corpo. Corpo santo de elefanto que não se cobre de manto. Cada hora do dia é uma coisa fria sem a presença vibrantemente acondicionada da senhora e suas mães e suas filhas.
Amar é não coisar assim por dá cá aquela palha mas por dá cá aquela alma, não é senhora?
Morte ao amor bolorento e as mãos cheias de boas intenções - já dizia o Zé Coelho que vivia sem colhões!
Amar não é cada vez que se descaia mas cada vez que levanta a saia. Catraia dos montes, mulher de horizontes que em cada vez que se vier a saber só lhe resta sofrer.
Doce dor a da couve-flôr que lhe comem as flores para lhe deixar o talo.
..
No tempo da fruta fresca...as lavadeiras do rio, de cú empinado para o céu, lavam as roupas dos maridos e dos seus Senhores de condição.
Senhores estes que em determinada e certa estação se dispõem em não usar ceroulas para lhes desfrutarem as pernas, as coxas e do belo e quente melão.
Lava-se a fruta, para mal dos nossos pecados, que belo e piedoso acto, e a mesma água não passará mais por ali nem pelo centro tumefacto.
No tempo da fruta fresca era só colheita e pesca de peixe esguio à beira do rio. Virgens com cio, mulheres de corpo frio em toda a sua desenvoltura de que se amadurece cai ou se vem ou se vai.
Espaço na cesta não faltava para o varão que as tentava no tempo da putaresca.
Não se podia amar de frente, nos de baixo se usa o pente nos de cima rolos quentes. Em cada acordar o espremer do néctar escorrido de ferido de dente ardente.
Chumbo interrompido, traseiro erguido na apanha da fruta fresca que detesta cair sem ser pelas tuas mãos meu amor.
Quem não a conheceu fresca não poderá saber do ácido da sua boca em luares de louca.
Pouca coisa para além. Tudo se encontrava aquém no cimo do solstício de sol e coiso a pino. A fruta acima do pepino olhando de ramo pendente para o legume enterrado. Grossa a terra à sua volta que jamais permitirá a transcendência.
Coisas de paciência. Brincadeiras sem essência. Toques profundos nos segredos do mundo que não te deixam ir ao fundo esvaziando-te do teu peso de ser. Horas de foder.
Missão de missionário sempre por cima nunca por baixo.
Cobertura achocolatada a que se partilha com a amada, bezerra desmamada. Terra já lavrada à espera de semente. Ardente fotossíntese que coloras a tez de agonia verde. Esquecerdes.
No tempo da fruta fresca, fruta da época das épocas percorridas com um anzol na boca e outro no sexo, porque a língua sempre trai a boca e as boas intenções. Rega-se então bem a palavrinha e põe-se de molho o cérebro.
SONHO *
Estou no chão de areia de um precipício em fogo. Lá em baixo uma forma de gigante cilíndro brilhante desaba sobre mim como um foguetão descendente. é um extintor. Diz-me algo que me consola, de chapéu de coco com leite a escorrer. A malta aproxima-se mas não se consegue chegar, não sei o que querem… miragem desdobrada em faixas horizontais que se transforma em montanhas brancas com lírios no topo. O meu braço está preso entre as pernas e faço um vôo de helicópetro numa cidade futurista. Esqueci-me da revista que tinha de entregar e por isso volto atrás. Na fachada ergue-se um pórtico de luz vermelha e por detrás da porta surge o meu gato que ficou sem pelo e é do meu tamanho. Convida-me para entrar. Calça sapatos de dois saltos e aconchego a roupa que só tenho da cintura para baixo. Uma nuvem passa pelos desenhos da cortina, abrem-se as pernas do gato e eu estou por cima, agarrei-me a um lustre que não estava agarrado ao tecto e agora sou eu que o seguro. Peço socorro e vejo-me de novo na água, por cima o precipício em fogo e o extintor que me cai por cima. Sei que sou viúva mas não sei de quem. Nado para chegar à margem e sou puxada pelo pé. Calmamente coloco o chapéu e deixo-me ir. Fico a rir de felicidade até que me apercebo da malta que me olha reticente. Há alguém doente e por isso tenho de me ir embora. Vou sozinha pela estrada de terra e tijolos brancos. Hoje parece dia santo e ao longe ouvem-se os sinos. Como estou atrasada corro, como corro voo, até ao aterro pantanoso com dois animais que me procuram. Há vinho na mesa e bebo. Tenho de agarrar muito bem o copo para não cair e isso excita-me. Há dois grandes montes de areia no peito. Sacudo e voltam a crescer. Por detrás dos montes vê-se o sol nascer e todos voltam para casa. Esqueci-me do caminho por isso procuro o meu gato sem pelo. Afinal é um cavalo. Ponho-me de pé em cima da sua cauda e ele leva-me a uma casa mas não é a minha, é de meninas. Todas rotas, com tudo à mostra e muito contentes à espera. Parece que é um grande dia. Agora sou uma delas mas ninguém sabe.